capítulo anterior      ÍNDICE      capítulo seguinte

 V -  A  FILOSOFIA  GREGA  e  A  SAGRADA  DOUTRINA
 
 
        A   FILOSOFIA   GREGA:
 
  "UMA  VIDA  SEM  BUSCA  NÃO  É  DIGNA  DE  SER  VIVIDA."
Assim  disse  o  filósofo  grego  SÓCRATES,  desde  os  anos  400  a.C.
 
        Entre  o  final  do  século  VII  e  início  do  século  VI  a.C.  surgiu  em  Mileto  um  pensador,  chamado  TALES,  a  quem  se  atribui  o  início  da  FILOSOFIA  GREGA.  A  finalidade  da filosofia  era  buscar  conhecer,  com  o  uso  da  RAZÃO,  qual  o  PRINCÍPIO  ORIGINÁRIO  do  universo  e  de  todas  as  coisas.  Portanto,  mediante  explicação  puramente  RACIONAL.  Visava  o  puro  desejo  de  conhecer  e  contemplar  a  verdade.  FILO-SOFIA,  isto  é,  "amor  pela  sabedoria".
 
        Os  primeiros  filósofos  foram  denominados  NATURALISTAS ,  ou  FÍSICOS,  porque  imaginavam  que  o  princípio  originário  das  coisas  era  "PHYSIS"  (NATUREZA,  GERAÇÃO),  um  princípio  físico.  TALES  achava  que  esse  princípio  era  a  ÁGUA  e,  em  sua  explicação  racional,  argumentava  que  a  nutrição  de  todas  as  coisas  é  úmida,  as  sementes  e  os  germes  têm  natureza  úmida,  a  secagem  total  significa  a  morte.  Alguns  filósofos  naturalistas  achavam  que  o  princípio  era  o  ar  infinito,  outros  o  fogo,  etc.,  e  cada  um  apresentava  a  sua  OPINIÃO  "racional".
 
        PITÁGORAS  e  os  seus  seguidores,  denominados  Pitagóricos,  dedicaram-se  muito  à  matemática.  Acostumados  a  lidar  com  números,  observaram  que  as  notas  e  os  acordes  musicais  guardavam  entre  sí  uma  ordenação  numérica.  Achavam  que  os  NÚMEROS  eram  o  princípio  de  todas  as  coisas  pois  determinam  a  sua  ordem  e  perfeição;  tudo  é  ordem.  E  como  ordem  em  grego  é  "kosmos"  o  universo  foi  chamado  COSMOS.
 
        Com  efeito,  havia  algo  de  verdade  em  suas  afirmações,  uma  vez  que  os  números  PARTICIPAM  da  ordem  do  universo.  Mas  parece  que  não  haviam  compreendido  que  os  números  só  participam  como  NUMERADOS,  e  não  como  NUMERANTES,  pois  os  números  não  existem  por  sí  mesmos,  existem  na  inteligência  de  quem  estabelece  a  ordem.  Mesmo  assim,  tiveram  sensibilidade  para  perceber  que  tudo  é  ORDEM,  os  números  participam  da  ordem  de  todas  coisas.   Pois  a  BÍBLIA  revela  a  verdade  da  ORDEM  no  universo,  disposta  pelo  CRIADOR:
 
"..dispuseste  todas  as  coisas  com  MEDIDA,  NÚMERO  e  PESO."
(Sb  11,   20).
 
        Os  Pitagóricos  sustentavam,  também,  o  princípio  da  METEMPSICOSE,  isto  é,  a  transmigração  das  almas,  ou  REENCARNAÇÃO,  com  base  nos  mistérios  órficos,  com algumas  variações.
 
        Outro  filósofo-poeta  de  renome  foi  XENÓFANES,  que  nasceu  cerca  do  ano  570  a.C.  O  tema  principal  do  seu  pensamento  foi  a  crítica  à  concepção  dos  deuses  mitólogicos  de  Homéro  e  Hesíodo,  assinalada  em  alguns  de  seus  versos,  como  se  segue:
 
"Mas  os  mortais  acham  que  os  deuses  nascem,  que  têm  roupas,  vozes  e  vultos  como  eles.
Homéro  e  Hesíodo  atribuem  aos  deuses  tudo  aquilo  que  é  desonra  e  vergonha  para  os  homens:  roubar,  cometer  adultério,  enganar-se  mutuamente."
 
         O  deus  de  Xenófanes  é  o  deus-cosmos,  como  ele  escreve:
 
"Tudo  ele  vê,  tudo  ele  pensa,  tudo  ele  ouve.
Sem  esforço,  com  a  força  de  sua  mente,  tudo  faz  vibrar.
Permanece  sempre  no  mesmo  lugar,
sem  se  mover  de  modo  algum...
Tudo  nasce  na  terra  e  na  terra  termina"
 
        PARMÊNIDES,  foi  outro  grande  filósofo,  que  nasceu  no  século  VI  a.C.  e  morreu  na  segunda  metade  do  século  V  a.C.  Apresentou-se  como  um  pensador  revolucionário,  com  sua  doutrina  do  SER,  cujo  princípio  é  o  seguinte:
 
"O  SER  É  e  não  pode  não  ser;
o  NÃO-SER  NÃO  É,  e  não  pode  ser  de  modo  algum...
O  ser  é  incriado  e  incorruptivel".
 
        O  ser  e  o  não-ser  são  tomados  por  Parmênides  no  seu  significado  integral,  isto  é,  o  ser  é  o  positivo  puro,  tem  existência;  o  não-ser  é  o  negativo  puro,  não  tem  existência,  é  o  nada;  um  é  o  absoluto  contrário  do  outro,  como  diz  em  alguns  de  seus  versos:
 
"É  necessário  dizer  e  pensar  que  O  SER  seja:
com  efeito,  o  SER  é,  o  NADA  não  é.
Um  só  caminho  resta  ao  discurso:  o  que  o  ser  é?
...Pensar  e  ser  é  o  mesmo.
Porque  sem  o  ser,  no  qual  é  expresso,
não  encontrarás  o  pensar."
 
        Depois  do  periodo  naturalista,  em  que  os  filósofos  buscaram  mais  conhecer  a  natureza  ou  realidade  do  cosmos,  chega-se  ao  período  HUMANISTA,  onde  o  interesse  da  busca  filosófica  muda  de  objetivo:  do  cosmos  para  o  homem.
 
        Surge  o  movimento  SOFISTA,  que  significa  especialista  do  saber.  Alguns  filósofos  desdenharam  o  movimento  sofista,  dizendo  que  o  seu  saber  era  falso,  só  aparente,  pois  não  buscava  a  verdade  desinteressadamente  mas  visava  lucro,  exigindo  compensação  em  dinheiro  pelos  ensinamentos.  Mas  os  sofistas  mudaram  o  enfoque  da  filosofia,  da  natureza  para  o  homem,  abordando  temas  como  ética,  política,  arte,  religião,  educação,  portanto  com  grande  influência  na  cultura  do  homem.
 
        Depois  veio  SÓCRATES,  que  viveu  entre  os  anos  470  e  399  a.C.  Com  a  sua  filosofia  moral  buscou  determinar  a  essência  do  homem,  procurou  responder  à  questão  sobre  a  natureza  ou  realidade  última  do  homem.  Para  Sócrates,  a  essência  do  homem  é  a  sua  PSYCHÉ,  a  sua  alma,  entendendo  por  alma  a  consciência,  a  personalidade  intelectual  e  moral  do  homem.  O  corpo  é  receptáculo  da  alma,  e  cuidar  da  alma  é  a  suprema  obrigação  moral  do  homem.
 
        PLATÃO,  que  viveu  entre  os  anos  428  a  347  a.C.,  discípulo  de  Sócrates,  aparece  como  um  marco  fundamental  na  história  da  filosofia  grega.  Apresentou  a  idéia  filosófica  da  existência  de  uma  REALIDADE  SUPRAFÍSICA  DO  SER,  que  os  naturalistas  não  imaginaram,  pois  tentavam  explicar  a  origem  dos  fenômenos  e  das  coisas  através  de  causas  físicas,  sensíveis,  como  água,  terra,  fogo,  ar,  calor,  etc.
 
        Para  Platão  devia  existir  uma  outra  causa  originária  verdadeira,  não  sensivel,  imaterial,  e  denominou  essa  causa  com  os  termos  IDÉIA  e  EIDOS,  que  significam  FORMA.  Nesta  concepção  a  Idéia  não  significa  o  pensamento,  mas  a  essência  das  coisas,  a  FORMA:  esta  constitui  o  MODÊLO.  Os  modêlos  teriam  existência  real.  O  conjunto  das  Idéias  foi  denominado  lugar  HIPERURÂNIO,  que  significa  lugar  acima  do  céu  ou  acima  do  cosmos  físico,  abrange  a  totalidade  do  ser  inteligivel  e  situa-se  na  dimensão  do  eterno,  incriado,  enquanto  o  mundo  sensivel  situa-se  na  dimensão  do  tempo.
 
        Segundo  Platão  o  mundo  sensivel,  mundo  físico,  foi  plasmado  sobre  a  matéria  (chora)  preexistente,  por  um  DEMIURGO,  deus  ARTÍFICE,  tendo  como  modêlo  o  mundo  das  idéias.  Para  ele,  o  mundo  das  idéias  é  REAL,  eterno  e  incriado,  mas  não  é  inteligência,  simplesmente  existe  eternamente.
 
        Quanto  ao  homem,  Platão  adota,  com  algumas  variações,  a  doutrina  do  orfismo,  isto  é,  a  transmigração  das  almas  em  vários  corpos,  através  de  renascimentos  em  diferentes  formas  de  seres  vivos,  para  cumprimento  de  suas  penas.  O  corpo  é  entendido  como  tumba  ou  cárcere  da  alma.
 
        Sobre  as  ARTES,  poéticas,  pictóricas  e  plásticas,  para  Platão  não  são  mais  que  pura  IMITAÇÃO  DAS  REALIDADES,  são  apenas  distanciamentos  da  verdade.  Quanto  mais  se  afastam  da  realidade,  tanto  mais  se  tornam  perniciosas  e  deseducam  o  homem,  pois  não  representam  a  verdade.  No entanto,  quando  retratam  bem  o  verdadeiro,  podem  ser  boas,  e  tanto  melhores  quanto  mais  se  aproximarem  do  modêlo  verdadeiro.
 
        ARISTÓTELES,  que  viveu  entre  384  e  322 a.C.,  discípulo  de  Platão,  foi  outro  nome  de  grande  importância  na  filosofia  grega.  Segundo  ele,  a  metafísica  é  a  ciência  mais elevada  que  pode  interessar  ao  homem,  porque  não  está  ligada  a  necessidades  materiais:   "todas  as  outras  ciências  podem  ser  mais  necessárias  ao  homem  mas nenhuma  é  superior  à  metafísica".   De  grande  significado  foi  o  conceito  que  introduziu  sobre  as  duas  possibilidades  do  SER,  ou  seja,  SER-EM-POTÊNCIA  e  SER-EM-ATO.  Conforme  sua  concepção,  a  matéria  prima  bruta  em  sí  é  ser-em-potência,  enquanto  o  ATO  realizador  é  que  dá  a  FORMA,  caracteriza  a  coisa  realizada  na  matéria,  concretiza  o  ser.
 
        Aristóteles  investigou  também  a  estrutura  dos  seres,  tendo  dedicado  uma  atenção  especial  aos  seres  vivos.  Para  ele  os  seres  animados  se  diferenciam  dos  seres  inanimados  porque  possuem  um  princípio  que  lhes  dá  a  vida,  e  esse  príncipio  é  a  ALMA.  Assim,  segundo  Aristóteles,  os  VEGETAIS  têm  uma  ALMA  VEGETATIVA,  princípio  mais  elementar  da  vida,  responsavel  pelas  funções  biológicas  como   NUTRIÇÃO,  CRESCIMENTO  E  GERAÇÃO.  Os  animais  IRRACIONAIS,  possuem  uma  ALMA  SENSITIVA,  que  é  responsavel  pelas  sensações  e  movimentos  do  corpo,  além  de  possuirem  a  alma  vegetativa,  comum  aos   vegetais.  Os  homens,  animais  RACIONAIS,  possuem  uma  ALMA  INTELECTIVA,  responsavel  pelo  pensamento  e  pelas  ações  racionais,  além  de possuirem  as  almas  vegetativa  e  sensitiva,  comuns  respectivamente  aos  vegetais  e  animais.
 
        Em  rápida  passagem  mostramos,  resumidamente,  como  desde  a  antiguidade  o  homem  procura  conhecer  filosoficamente  as  suas  origens,  a  sua  vida,  o  seu  destino  último.  Pois  o  homem  é  um  ser  inteligente,  racional.  O  homem  pensa,  conhece,  sabe  que  conhece,  tem  consciência  que  sabe,  pode  fazer  juizo:  o  homem  é  um  ser  de  transcendência.   Naqueles  tempos  dos  primeiros  filósofos,  a  busca  começava  a  partir  do  nada,  ou  do  quase  nada,  pois  pouco  se  sabía.  Hoje  é  diferente,  muitas  são  as  facilidades  do conhecimento,  graças  aos  alicerces  plantados  ao  longo  de  tantos  séculos  da  existência  do  homem,  aos  livros  disponíveis,  às  facilidades  de  comunicações.
 
        O  homem  de  hoje  pode  se  considerar  privilegiado  por  contar  com  tantas  fontes  de  conhecimento,  de  testemunho,  de  revelação  e,  com  inteligência,  sensiblidade,  e  iluminado  na  fé  pela  graça  de  Deus,  está  apto  a  procurar  e  conhecer  a  verdade  e  encontrar  o  seu  caminho,  realizar  o  seu  VERBO  HUMANO,  "construir-se"  a  sí  mesmo  e  ter  o  seu  encontro  com  Deus.
 
 
        A   SAGRADA   DOUTRINA:
 
 
          Diz  Santo  Tomás  de  Aquino  ( 1224 -- 1277 )  na  sua  obra  SUMA  TEOLÓGICA  (conforme  resumo  descrito  abaixo),   que  para  o  conhecimento  da  VERDADE  e  salvação  do  homem  não  bastam  os  conhecimentos  filosóficos  através  dos  raciocínios,  mas  é  necessário  o  conhecimento  através da  Sagrada  Doutrina,  REVELADA  por  DEUS.    O  que  é  revelado  por  Deus  deve  ser  acolhido  pelo  homem,  primeiramente  em  um  acolhimento  de  FÉ.   Embora  não  se  deva  investigar  apenas  pela  razão  aquilo  que   ULTRAPASSA  o  conhecimento  humano,  a  filosofia  busca  o  conhecimento  da  verdade  através  da  razão  humana.
 
        A  teologia,  porém,  conhece  a  VERDADE  segundo  a  razão  do  próprio  Deus.  Pela  razão  o  homem  chega  ao  conhecimento  das  CIÊNCIAS  HUMANAS,  procedendo  de  princípios  enunciados  à  luz  do  intelecto  humano.   A  SAGRADA  DOUTRINA  é  também  uma  ciência,  mas  a  mais  excelente,  pois  procede  de   princípios  revelados  por  Deus.  Não  significa  que  as  ciências  humanas  não  sejam  boas  ou  necessárias,  apenas  não  devem  ser  elevadas  a  um  plano  superior  à  doutrina  sagrada,  pois  esta  tem  por  fim  a    BEM-AVENTURANÇA   ETERNA.
 
        A  doutrina  sagrada  é  uma  sabedoria  que  vem  da  SABEDORIA  de  Deus,  sendo  portanto   conhecimento  e   CONTEMPLAÇÃO  das  coisas  divinas.  Conforme   se   vê   em   Santo  Agostinho,  a  SABEDORIA  é  chamada  o  conhecimento  das  coisas  DIVINAS.  Tudo  que  nas  outras  ciências  for  contrário  à  verdade  da  ciência  sagrada,  deve  ser  recusado  e  condenado  como  falso.  O  homem  virtuoso  em   sabedoria  deve  ser  tomado  como  medida  e  regra  dos  atos  humanos.   Adquire-se  a  sabedoria  não  apenas  estudando,  mas  experimentando  o  que  é  DIVINO.   Deus  é  o  próprio  SUJEITO  da  ciência  sagrada,  pois  nela  tudo  é  tratado  sob  a  razâo  de  Deus,  tudo   a   Ele  se  refere  como  a  seu  princípío,  sua  existência  e  seu  fim.  Tudo  que  a  doutrina  sagrada  trata  está   compreendido  em  Deus,  a   Ele  se  ordenando  de  algum  modo.
 
        A  doutrina  sagrada  pode  também  utilizar  a  razão  humana,  não  para  provar  artigo  de  fé,  mas  apenas  para  reforçar  e  iluminar  alguns  pontos,  já  que  a  fé  mesma  repousa  sobre  a  REVELAÇÃO,  com  base  na  ESCRITURA  SAGRADA,  revelação  de  Deus  feita  aos  profetas  e  aos  apóstolos,  E   POR   ELES   A   TODOS   OS   HOMENS.   Como  o  conhecimento  humano  se  origina  através  dos  SENTIDOS,  a  ESCRITURA  ensina  as  realidades  espirituais  muitas  vezes  através  de  metáforas  corporais,  por  necessidade,  por  ser  útil  à  melhor  compreensão,  para  que  as  pessoas  simples  as  compreendam,  assim   como  o  poeta  se  utiliza  de  metáforas  para  expressar  melhor  suas  idéias.
 
        As  representações  metafóricas  com  semelhanças  mais  distantes  de  Deus,  nos  mostram  que  Ele  está  acima  de  tudo  que  podemos  dizer  ou  pensar  que  Ele  É,  pois  só  podemos  dizer  que  Ele  é  o  SER   ETERNO,   INEFÁVEL,   HORIZONTE   INSONDÁVEL,  enfim,  como  o   próprio  Deus  disse  a  Moisés:   EU SOU O QUE SOU.       O  AUTOR  das  Escrituras  Sagradas  é  Deus.
 
        As  ESCRITURAS  têm  primeiramente  um  sentido  HISTÓRICO  ou  literal,  mas  têm  também  um  sentido  ESPIRITUAL,  que  pressupôe  e  está  fundado  no  sentido  literal,  e  pode  ser:
 
 capítulo anterior      ÍNDICE      capítulo seguinte